quarta-feira, setembro 30, 2009
DO PREFÁCIO DE "BREVE HISTÓRIA DOS JUDEUS EM PORTUGAL"
Já se publicaram algumas histórias dos judeus portugueses, todas elas de acentuado cariz académico, mas faltava uma obra de conjunto, actualizada e acessível ao grande público, destinada, particularmente, aos professores e aos estudantes, complementando ou suprindo as clamorosas omissões dos nossos programas escolares. É este o objectivo de Breve História dos Judeus em Portugal. Em consequência da nossa recente publicação de Portugal e os Judeus (Vega, 2006), constatámos que causou grande surpresa a descoberta de que, afinal, os judeus portugueses têm uma história para contar e que não é coisa dos outros, faz parte da História de Portugal.
Na verdade, os judeus constituem um caso singular na história da sociedade portuguesa. Já habitavam a Península Ibérica quando se formou o reino de Portugal, tendo participado na Reconquista. Mantiveram uma vivência globalmente pacífica no seio da maioria cristã, ao lado dos muçulmanos, até ao Édito de Expulsão de 1496. Participaram nos Descobrimentos com os seus vastos saberes. Baptizados à força, viveram uma dupla identidade: cristã e criptojudaica. Perseguidos pela Inquisição, resistiram às tentativas de extinção. Gradualmente emancipados pela legislação pombalina, liberal e republicana, reintegraram a sociedade portuguesa. Abandonados e esquecidos de si mesmos, emergiram num singular marranismo nas Beiras e em Trás-os-Montes, onde o braço inquisitorial tinha dificuldades em chegar. Protegidos por uma plêiade de diplomatas filo-semitas, muitos judeus europeus se salvaram do Holocausto e utilizaram Portugal como porta de saída da Europa, paulatinamente ocupa pela besta nazi. Graças à democracia resgatada em 1974, puderam assumir a plena prática do judaísmo, embora sem o fulgor de outrora, que os Tribunais do Santo Ofício trataram de destruir.
O facto de os judeus constituírem hoje uma pequena minoria em Portugal é o resultado desta história atribulada, mas que deixou traços indeléveis no resto da população, como o atesta o recente estudo genético, publicado no American Journal of Human Genetics, que concluiu que os portugueses apresentam cerca de 30% de ascendência sefardita (23,6% no Norte e 36,3% no Sul) ou seja, um terço dos portugueses preservou o “sangue judaico” durante mais de cinco séculos.
Jorge Martins
sexta-feira, setembro 25, 2009
APRESENTAÇÃO DO LIVRO "A TORMENTA DOS MOGADOURO NA INQUISIÇÃO DE LISBOA", PELO PROF. ANTÓNIO MARQUES DE ALMEIDA
Palavras de apresentação do livro de
Maria Fernanda Guimarães e de António Júlio Andrade
A tormenta dos Mogadouro na Inquisição de Lisboa
Não venho, propriamente, fazer-vos a apresentação de um livro, mesmo tratando-se de um estudo de grande importância, levado a cabo por Maria Fernanda Guimarães e António Júlio Andrade. Ainda tenho para mim que, se a prova do pudim se faz comendo-o, em relação aos livros, melhor do que todas as palavras que possam ser ditas, o melhor é mesmo lê-los. E vão ver que este livro vale a pena, muito, ser lido. E sobretudo meditado, ou reflectido.
Tão só venho dar-vos conta da vivência que com ele senti, na minha condição de leitor. Este livro não é um livro sobre a Inquisição. Se o fosse, seria um entre muitos, ainda que bom, porque, desde Alexandre Herculano a historiografia portuguesa sobre a Inquisição não tem parado de crescer. Ao contrário, a historiografia sobre as comunidades judaicas portuguesas é, comparativamente, menor, e de valia científica muito desigual.
Mas este livro também não é, propriamente, ainda que fale deles, um livro sobre judeus, ou cristãos-novos. Se fosse, isso bastaria para o saudarmos, a par do livro do Doutor Jorge Martins, como mais valia da historiográfica judaica portuguesa.
Este livro é sobre a indignidade a que a Inquisição sujeitou sucessivas gerações. A fala sobre a família Mogadouro confronta-nos com a Inquisição, ela própria, uma irracionalidade tamanha que, quando alguns de nós, hoje, pensamos que compreendemos o que aconteceu, estamos segura e redondamente enganados.
Este livro é uma fala sobre a humilhação e a ofensa, sobre a devassa da intimidade e a violação das consciências num mundo anterior ao surgimento dos cidadãos.
Confronta-nos com um tempo longo que, deixados para trás os anos de construção da monarquia afonsina e perdidas as energias iniciais da dinastia de Avis, a nossa comunidade se afundou numa atmosfera de medo que durou, arredondando períodos, de cerca de 1536 até 1822.
Foram quase trezentos anos durante os quais a sociedade portuguesa na sua globalidade, e não apenas as comunidades judaicas, se afundou numa atmosfera mental em que o medo, a denúncia, a delação foram, como dizia António Vieira, dias de pão, de que não só os processos da Torre do Tombo nos dão conta, mas também os testemunhos de tempos posteriores.
Exemplos? Entre muitos possíveis, e citando uma antiga sabedoria, em Portugal, os homens do século XVII apenas foram senhores do que calaram e, seguramente escravos do que disseram. Anos, adiante, já no século XVIII, alguém que pertencia à elite cultural – Marques de Alorna -, dizia numa carta à filha, encerrada no Convento de Chelas: “a medo vivo, a medo escrevo, a medo falo”.
No plano social e das estruturas mentais, foi esta a herança que a Inquisição nos legou: a paralisia social, a abolia individual e colectiva, uma vez mais, o medo que têm caracterizado, no decurso de tempo, sucessivas gerações de nossos concidadãos. Faltam na historiografia portuguesa estudos sobre o medo, cujo papel tem interessado mais os nossos amigos sociólogos do que os historiadores. O medo, de que, em 1933, Franklin Roosevelt falava: “não temos nada a recear a não ser o próprio medo”.
Mas, vozes houve que não foram silenciadas, ou não se deixaram silenciar. A par de outras, a de António Vieira, cuja luta de mais de trinta anos foi um compromisso político com a reabilitação social dos judeus portugueses em diáspora, compromisso que João Lúcio de Azevedo considerou excessivo.
O jesuíta não deixará de recriminar o comportamento da Inquisição portuguesa, da qual dizia ser mais bem feroz do que a castelhana, mas tem em mente criar as condições para que os "homens da nação" voltem a Portugal: "porque o que os mercadores portugueses ganham nos reinos estranhos, lá fica, e o que os estranhos ganham no nosso, para lá vai". Nenhum monetarista diria melhor, porque, tanto quanto sei a propósito, nenhum disse tanto.
Tudo o que os judeus pretendem, ou quase tudo, já está no relatório de 1643 e na proposta a D. João IV a favor da Gente da nação, de 1646. Vieira visava uma mudança estrutural na sociedade portuguesa, e que passava por um clima que permitisse o regresso da “gente da nação” e do seu potencial financeiro.
Começara por defender melhor tratamento de toda a população cristã-nova, que consistia em;
• Abrir os cárceres do Santo Ofício, solicitando em Roma um perdão geral para todas as heresias até à data;
• Chamar ao Reino os Judeus foragidos, dando-lhes a segurança de não serem vexados por práticas ou convicções de teor dogmático;
• Isentar da pena de confisco os bens móveis empregados no comércio;
• Eliminar a divisão e a distinção entre cristãos-velhos e cristãos-novos, quanto ao nome e quanto aos ofícios, e mesmo quanto às isenções.
• Finalmente, mudar os procedimentos processuais seguidos pela Inquisição nos casos de suspeição de hebraísmo, em sentido favorável aos eventuais réus. Defendia testemunhas à vista, um procedimento às claras, consoante o que se praticava nos tribunais civis (abertas e publicadas, como então se dizia).
Estas condições eram necessárias para que pudessem medrar as companhias de comércio, destinadas ao tráfico do Brasil e da Índia. Por esta via se lograria, seguramente, aumentar as rendas das alfândegas, e por via do incremento do comércio colonial, reforçar a capacidade de auto financiamento do Estado.
Di-lo muito cedo, logo em 1643: "Da sua vinda (dos Judeus) crescerão os direitos das alfândegas de maneira que eles bastam a sustentar os gastos da guerra, sem tributos nem opressões dos povos; pagar-se-ão os juros, as tenças, os salários a que as rendas reais hoje não chegam. Crescerá gente, que é uma parte do poder e estará o reino provido e abundante".
O tempo e a história, ou os dois, lhe deram razão.
Desse para onde desse, não havia futuro para as propostas de Vieira, e os textos de 1643 e de 1646 não produziram o efeito que desejava.
Trinta anos adiante (1671), quando se aproximava o fim desta luta em que, como em muitas outras, fora vencido, ainda dizia, em carta a Duarte Ribeiro de Macedo: "não poder haver maior cegueira que não querer ser rico e poderoso com o capital alheio".
Não deixará ainda de reclamar para os Judeus a segurança real e pontifícia por que sempre se batera, mas a frase é tão só um desabafo de vencido, quando está próximo o cair do pano sobre o último acto da vida.
António Sérgio disse ter sido a sua, uma das mais belas lutas pela liberdade de consciência travadas em Portugal.
Não querendo abusar mais da vossa paciência, dir-vos-ei, a terminar, que, embora pareça que não estive a falar do livro, procurei que as minhas palavras fossem o tabuleiro, onde se joga, ou jogou, o jogo da opressão e da resistência, tão bem documentado na memorização do drama da família Mogadouro, de que os autores nos dão conta no seu livro.
Servindo-se de uma escrita depurada, traçaram o percurso dramático de uma família. Talvez pareça pouco, não fora isso o paradigma que nos moldou e que ainda hoje, passados séculos, nos faz ser como somos. Mais grave ainda: nos faz ser aquilo que somos.
Obrigado Maria Fernanda e António Andrade por no-lo recordar. O vosso livro vai-nos dar muito que pensar.
A. Marques de Almeida
Lisboa, 24 de Setembro de 2009
Maria Fernanda Guimarães e de António Júlio Andrade
A tormenta dos Mogadouro na Inquisição de Lisboa
Não venho, propriamente, fazer-vos a apresentação de um livro, mesmo tratando-se de um estudo de grande importância, levado a cabo por Maria Fernanda Guimarães e António Júlio Andrade. Ainda tenho para mim que, se a prova do pudim se faz comendo-o, em relação aos livros, melhor do que todas as palavras que possam ser ditas, o melhor é mesmo lê-los. E vão ver que este livro vale a pena, muito, ser lido. E sobretudo meditado, ou reflectido.
Tão só venho dar-vos conta da vivência que com ele senti, na minha condição de leitor. Este livro não é um livro sobre a Inquisição. Se o fosse, seria um entre muitos, ainda que bom, porque, desde Alexandre Herculano a historiografia portuguesa sobre a Inquisição não tem parado de crescer. Ao contrário, a historiografia sobre as comunidades judaicas portuguesas é, comparativamente, menor, e de valia científica muito desigual.
Mas este livro também não é, propriamente, ainda que fale deles, um livro sobre judeus, ou cristãos-novos. Se fosse, isso bastaria para o saudarmos, a par do livro do Doutor Jorge Martins, como mais valia da historiográfica judaica portuguesa.
Este livro é sobre a indignidade a que a Inquisição sujeitou sucessivas gerações. A fala sobre a família Mogadouro confronta-nos com a Inquisição, ela própria, uma irracionalidade tamanha que, quando alguns de nós, hoje, pensamos que compreendemos o que aconteceu, estamos segura e redondamente enganados.
Este livro é uma fala sobre a humilhação e a ofensa, sobre a devassa da intimidade e a violação das consciências num mundo anterior ao surgimento dos cidadãos.
Confronta-nos com um tempo longo que, deixados para trás os anos de construção da monarquia afonsina e perdidas as energias iniciais da dinastia de Avis, a nossa comunidade se afundou numa atmosfera de medo que durou, arredondando períodos, de cerca de 1536 até 1822.
Foram quase trezentos anos durante os quais a sociedade portuguesa na sua globalidade, e não apenas as comunidades judaicas, se afundou numa atmosfera mental em que o medo, a denúncia, a delação foram, como dizia António Vieira, dias de pão, de que não só os processos da Torre do Tombo nos dão conta, mas também os testemunhos de tempos posteriores.
Exemplos? Entre muitos possíveis, e citando uma antiga sabedoria, em Portugal, os homens do século XVII apenas foram senhores do que calaram e, seguramente escravos do que disseram. Anos, adiante, já no século XVIII, alguém que pertencia à elite cultural – Marques de Alorna -, dizia numa carta à filha, encerrada no Convento de Chelas: “a medo vivo, a medo escrevo, a medo falo”.
No plano social e das estruturas mentais, foi esta a herança que a Inquisição nos legou: a paralisia social, a abolia individual e colectiva, uma vez mais, o medo que têm caracterizado, no decurso de tempo, sucessivas gerações de nossos concidadãos. Faltam na historiografia portuguesa estudos sobre o medo, cujo papel tem interessado mais os nossos amigos sociólogos do que os historiadores. O medo, de que, em 1933, Franklin Roosevelt falava: “não temos nada a recear a não ser o próprio medo”.
Mas, vozes houve que não foram silenciadas, ou não se deixaram silenciar. A par de outras, a de António Vieira, cuja luta de mais de trinta anos foi um compromisso político com a reabilitação social dos judeus portugueses em diáspora, compromisso que João Lúcio de Azevedo considerou excessivo.
O jesuíta não deixará de recriminar o comportamento da Inquisição portuguesa, da qual dizia ser mais bem feroz do que a castelhana, mas tem em mente criar as condições para que os "homens da nação" voltem a Portugal: "porque o que os mercadores portugueses ganham nos reinos estranhos, lá fica, e o que os estranhos ganham no nosso, para lá vai". Nenhum monetarista diria melhor, porque, tanto quanto sei a propósito, nenhum disse tanto.
Tudo o que os judeus pretendem, ou quase tudo, já está no relatório de 1643 e na proposta a D. João IV a favor da Gente da nação, de 1646. Vieira visava uma mudança estrutural na sociedade portuguesa, e que passava por um clima que permitisse o regresso da “gente da nação” e do seu potencial financeiro.
Começara por defender melhor tratamento de toda a população cristã-nova, que consistia em;
• Abrir os cárceres do Santo Ofício, solicitando em Roma um perdão geral para todas as heresias até à data;
• Chamar ao Reino os Judeus foragidos, dando-lhes a segurança de não serem vexados por práticas ou convicções de teor dogmático;
• Isentar da pena de confisco os bens móveis empregados no comércio;
• Eliminar a divisão e a distinção entre cristãos-velhos e cristãos-novos, quanto ao nome e quanto aos ofícios, e mesmo quanto às isenções.
• Finalmente, mudar os procedimentos processuais seguidos pela Inquisição nos casos de suspeição de hebraísmo, em sentido favorável aos eventuais réus. Defendia testemunhas à vista, um procedimento às claras, consoante o que se praticava nos tribunais civis (abertas e publicadas, como então se dizia).
Estas condições eram necessárias para que pudessem medrar as companhias de comércio, destinadas ao tráfico do Brasil e da Índia. Por esta via se lograria, seguramente, aumentar as rendas das alfândegas, e por via do incremento do comércio colonial, reforçar a capacidade de auto financiamento do Estado.
Di-lo muito cedo, logo em 1643: "Da sua vinda (dos Judeus) crescerão os direitos das alfândegas de maneira que eles bastam a sustentar os gastos da guerra, sem tributos nem opressões dos povos; pagar-se-ão os juros, as tenças, os salários a que as rendas reais hoje não chegam. Crescerá gente, que é uma parte do poder e estará o reino provido e abundante".
O tempo e a história, ou os dois, lhe deram razão.
Desse para onde desse, não havia futuro para as propostas de Vieira, e os textos de 1643 e de 1646 não produziram o efeito que desejava.
Trinta anos adiante (1671), quando se aproximava o fim desta luta em que, como em muitas outras, fora vencido, ainda dizia, em carta a Duarte Ribeiro de Macedo: "não poder haver maior cegueira que não querer ser rico e poderoso com o capital alheio".
Não deixará ainda de reclamar para os Judeus a segurança real e pontifícia por que sempre se batera, mas a frase é tão só um desabafo de vencido, quando está próximo o cair do pano sobre o último acto da vida.
António Sérgio disse ter sido a sua, uma das mais belas lutas pela liberdade de consciência travadas em Portugal.
Não querendo abusar mais da vossa paciência, dir-vos-ei, a terminar, que, embora pareça que não estive a falar do livro, procurei que as minhas palavras fossem o tabuleiro, onde se joga, ou jogou, o jogo da opressão e da resistência, tão bem documentado na memorização do drama da família Mogadouro, de que os autores nos dão conta no seu livro.
Servindo-se de uma escrita depurada, traçaram o percurso dramático de uma família. Talvez pareça pouco, não fora isso o paradigma que nos moldou e que ainda hoje, passados séculos, nos faz ser como somos. Mais grave ainda: nos faz ser aquilo que somos.
Obrigado Maria Fernanda e António Andrade por no-lo recordar. O vosso livro vai-nos dar muito que pensar.
A. Marques de Almeida
Lisboa, 24 de Setembro de 2009
SESSÃO DE LANÇAMENTO - LIVRARIA CÍRCULO DAS LETRAS - 24/09/2009
A sessão de lançamento duas primeiras obras da colecção "Sefarad" contou com a presença de cerca de 70 pessoas. Aqui fica o texto de apresentação da obra "Breve História dos Judeus em Portugal", da autoria de António Eloy:
“Que as palavras que o vento leva arrastem as cinzas sobre as quais temos alicerçado passado, que no futuro não queremos repetir, que as palavras carreguem a realidade com o sofrimento e os heroísmos de que é feita a história e nunca esqueçamos quem somos e donde vimos.”
Eu, nesta apresentação, neto de marrano, tetraneto de judeus retornados de Marrocos, que se estabeleceram em Lisboa como ourives e que não deixaram de procurar comunidade e alegria, estou grato.
Antes de mais por podermos partilhar este momento.
Esta apresentação não tem inocência, tem um lugar.
Um lugar de quem pensa que a história é também a transformação desse lugar, em mais conhecimento, compreensão e cidadania.
É com todo o gosto que venho apresentar este precioso livro de Jorge Martins, para o qual julgo ter empenhado algum “ar”, no seguimento de comentário que lhe fiz sobre a edição em 3 tomos do que foi substancialmente a tese de doutoramento que defendeu, e que me mereceu alem de uma avaliação pela espessura e densidade, aliada há que dizê-lo à qualidade e cidadania, que prestigiam o historiador, uma nota sobre a necessidade de transformá-la em documento mais leve na leitura, que servisse para introduzir os nossos jovens a esta importante dimensão da nossa história, de nós mesmos.
Aqui temos esta #Breve História dos Judeus em Portugal# a preencher a lacuna, a tornar incontornável, esta parte de nós no ensino.
Nesta #Breve# vamos dos 1ºs povoamentos judaicos que chegaram até a Ibéria/Sefarad com populações fenícias, passando pela especificação profissional que tipificava a organização social e que conduziu ao #racismo# /religioso e à Inquisição, como momento que além de ideológico é baseado numa lógica económica, do orgulhosamente sós,,,.
A história complexa do retorno no seguimento do fim da Inquisição, à solidão das comunidades perdidas, e aos detalhes de que também é feita a história e às estórias que essas sim honram uma parte de nós.
E, não quero deixar de lançar aqui mais um desafio ao Jorge, de completar em novo documento o pensamento que nos deixa com água na boca, e que é sintetizado:
# perdemos a nossa plena identidade a partir do inicio do século XVI e nunca mais a recuperámos até hoje.#
Fala-nos da perda da nossa identidade que também é, como sabemos muito bem, judaica, e com mais este e outros trabalhos começamos a recuperar.
Não se pode compreender o atraso sócio-cultural, das nossas estruturas produtivas, o bloqueio das ideias sem conhecer e desenvolver o notável ensaio de Antero de Quental, #As causas da Decadência....#, e sem agora que está estabelecido este documento #Breve# desenvolver trabalho e investigação sobre as articulações que daqui decorrem e que o Jorge tão bem nos “apetiza” nestas conclusões.
Mas apresentar um livro, este livro é, para mim, também uma ocasião e oportunidade para abordar três pontos:
1-A História.
Cito:
#Uma palavra, em suma, domina e ilumina os nossos estudos: “compreender”.
Não afirmemos que o bom historiador é alheio às paixões; tem aquela, pelo menos.
Palavra essa, não tenhamos ilusões, cheia de dificuldades, mas também de esperança.
Palavra cheia, sobretudo, de amizade.
Até na acção julgamos de mais.
É tão cómodo gritar “à forca”!
Nunca compreendemos bastante.
Quem difere de nós – estrangeiro, adversário político – passa, quase necessariamente, por mau.
Mesmo para orientar as lutas inevitáveis, seria necessário um pouco mais de inteligência das almas; com mais forte razão se as queremos evitar, quando ainda é tempo.
A história, se renunciar ela mesma aos seus falsos ares de arcanjo, deve ajudar a curar-nos desta mania.
Ela é uma vasta experiência da diversidade humana, um longo encontro dos homens.
A vida, como a ciência, tem tudo a ganhar se o encontro for fraternal.#
De Marc Bloch, historiador, resistente, torturado e fuzilado pela Gestapo em 1944
A história, ciência dos homens no tempo, é conhecimento do passado a progredir no tempo.
Conhecimento filtrado pelos autores, detentores do discurso, filtradores de todos os elementos da vida e continuidade do, de um povo, de todos os elementos da sua existência.
A leitura, a busca dessa leitura que nos é dada da história tem instrumentos, que são determinados pelas bases da investigação, e aqui quero mencionar o Homem, o meu velho conhecimento do Jorge.
Percorremos a licenciatura cruzando-nos ocasionalmente, numa Faculdade de Letras em efervescência, nos anos pós 25 de Abril em que a descoberta da cidadania se fazia na história, com notáveis “facilitadores” que muitas vezes eram, noutros momentos, camaradas, como António Borges Coelho, Cláudio Torres, Isabel Castro Henriques, Vítor Gonçalves, Manuel Maia, Mª José Trindade, Jorge Custódio meia dúzia que me vem à memoria de tantos que criaram uma dinâmica de aprendizagem que entroncava numa cidadania recuperada e num sentido para a história. Por estas Letras conheci o “Galinheiras” que era um tributo ao que penso era ou tinha sido o seu local de residência ou militância politica.
Em Letras penso que construímos um entendimento que motivou o re-encontro, com a magna História que o Jorge, continuador da busca, transformação do passado em conhecimento no presente, prosseguiu.
2-A Cidadania
# A medo vivo, a medo escrevo e falo,
hei medo do que falo só comigo;
mas inda a medo cuido, a medo calo#
Cavaleiro de Oliveira, citado em “O Judeu” de Bernardo Santareno
Não é possível identificar Portugal sem lhe reconhecermos a alma judaica,
mas também sem analisarmos a alma negra do medo da inquisição e do fanatismo, a alma megera da maldade, que tem que ver com o espírito da massa, manipulada sabiamente pela ignorância ao serviço da cupidez, e de interesses sócio-económicos específicos, de manutenção ou consolidação de privilégios.
A Inquisição, à qual como nos diz o Cavaleiro de Oliveira, agora pela palavra de Santareno “ se deve o empobrecimento do Reino, porque para substituir o Santo Ofício inventa judeus como outros fabricam moeda...! “
Mas o empobrecimento do Reino, ontem como hoje não é o empobrecimento de todos:
Uma economia fechada ao desenvolvimento comercial e industrial e à internacionalização e,
a mais cidadania que com essa mobilidade se gera,
uma classe dominante anquilosada em lógicas de poder familiar e de bens em meia dúzia, uma indústria incapaz de consolidação e sustentação no mercado,
um sistema politico bloqueado, dominado por castas e manipulado por instituições acima do crivo democrático, onde os cargos resultam de compra, e relações familiares,
não, não estou a falar dos dias de hoje, embora pudesse, mas das trevas que desde a Inquisição parecem toldar um Portugal que continua a arredar-se da sua história e a não aprender com a compreensão desta.
Defender a História toda, a sua melhor compreensão, é um acto da maior relevância politica e esta Breve História dos Judeus em Portugal é um marco incontornável para o direito dos jovens, de todos os portugueses ao seu passado.
Devia ser indispensável nos curricula escolares.
3- O Homem,
Já aqui referi algum passado que partilho com o Jorge.
Referi que nos reencontrámos no âmbito da publicação dos 3 volumes da magna História # Portugal e os Judeus#, e por esta me ter agradado e surpreendido, pela densidade, informação e envolvimento do historiador.
Penso, e isso já ficou claro, que o sujeito da história, aquele que nela pega, a constrói e re-constrói, nela procura os elementos que explicam outros elementos, a continuidade que busca outra continuidade, esse sujeito da história não pode ser um esbracejador de novelas rascas de figuras de pamplina, mas deve sim ser um cultor de responsabilidade cívica e social.
Cruzei-me, também, com o Jorge na realização, no quadro da concretização, num espaço carregado de história, no Largo de S.Domingos, do Memorial ao Massacre de 1506.
Esse Memorial regista, num espaço que é hoje na zona do novo “marranismo” que são os cruzamentos de populações de origens diversas, de diferentes religiões, dos mais vários costumes, que é a diversidade e o respeito por essa, perpetua o que queremos um elemento de referencia de direitos humanos e cidadania.
O Jorge é um historiador e um cultor da responsabilidade cívica, a quem agradeço mais este #Breve# que espero atinja outras almas e outras gentes...
Obrigado Jorge, pela tua compreensão.
“Que as palavras que o vento leva arrastem as cinzas sobre as quais temos alicerçado passado, que no futuro não queremos repetir, que as palavras carreguem a realidade com o sofrimento e os heroísmos de que é feita a história e nunca esqueçamos quem somos e donde vimos.”
Eu, nesta apresentação, neto de marrano, tetraneto de judeus retornados de Marrocos, que se estabeleceram em Lisboa como ourives e que não deixaram de procurar comunidade e alegria, estou grato.
Antes de mais por podermos partilhar este momento.
Esta apresentação não tem inocência, tem um lugar.
Um lugar de quem pensa que a história é também a transformação desse lugar, em mais conhecimento, compreensão e cidadania.
É com todo o gosto que venho apresentar este precioso livro de Jorge Martins, para o qual julgo ter empenhado algum “ar”, no seguimento de comentário que lhe fiz sobre a edição em 3 tomos do que foi substancialmente a tese de doutoramento que defendeu, e que me mereceu alem de uma avaliação pela espessura e densidade, aliada há que dizê-lo à qualidade e cidadania, que prestigiam o historiador, uma nota sobre a necessidade de transformá-la em documento mais leve na leitura, que servisse para introduzir os nossos jovens a esta importante dimensão da nossa história, de nós mesmos.
Aqui temos esta #Breve História dos Judeus em Portugal# a preencher a lacuna, a tornar incontornável, esta parte de nós no ensino.
Nesta #Breve# vamos dos 1ºs povoamentos judaicos que chegaram até a Ibéria/Sefarad com populações fenícias, passando pela especificação profissional que tipificava a organização social e que conduziu ao #racismo# /religioso e à Inquisição, como momento que além de ideológico é baseado numa lógica económica, do orgulhosamente sós,,,.
A história complexa do retorno no seguimento do fim da Inquisição, à solidão das comunidades perdidas, e aos detalhes de que também é feita a história e às estórias que essas sim honram uma parte de nós.
E, não quero deixar de lançar aqui mais um desafio ao Jorge, de completar em novo documento o pensamento que nos deixa com água na boca, e que é sintetizado:
# perdemos a nossa plena identidade a partir do inicio do século XVI e nunca mais a recuperámos até hoje.#
Fala-nos da perda da nossa identidade que também é, como sabemos muito bem, judaica, e com mais este e outros trabalhos começamos a recuperar.
Não se pode compreender o atraso sócio-cultural, das nossas estruturas produtivas, o bloqueio das ideias sem conhecer e desenvolver o notável ensaio de Antero de Quental, #As causas da Decadência....#, e sem agora que está estabelecido este documento #Breve# desenvolver trabalho e investigação sobre as articulações que daqui decorrem e que o Jorge tão bem nos “apetiza” nestas conclusões.
Mas apresentar um livro, este livro é, para mim, também uma ocasião e oportunidade para abordar três pontos:
1-A História.
Cito:
#Uma palavra, em suma, domina e ilumina os nossos estudos: “compreender”.
Não afirmemos que o bom historiador é alheio às paixões; tem aquela, pelo menos.
Palavra essa, não tenhamos ilusões, cheia de dificuldades, mas também de esperança.
Palavra cheia, sobretudo, de amizade.
Até na acção julgamos de mais.
É tão cómodo gritar “à forca”!
Nunca compreendemos bastante.
Quem difere de nós – estrangeiro, adversário político – passa, quase necessariamente, por mau.
Mesmo para orientar as lutas inevitáveis, seria necessário um pouco mais de inteligência das almas; com mais forte razão se as queremos evitar, quando ainda é tempo.
A história, se renunciar ela mesma aos seus falsos ares de arcanjo, deve ajudar a curar-nos desta mania.
Ela é uma vasta experiência da diversidade humana, um longo encontro dos homens.
A vida, como a ciência, tem tudo a ganhar se o encontro for fraternal.#
De Marc Bloch, historiador, resistente, torturado e fuzilado pela Gestapo em 1944
A história, ciência dos homens no tempo, é conhecimento do passado a progredir no tempo.
Conhecimento filtrado pelos autores, detentores do discurso, filtradores de todos os elementos da vida e continuidade do, de um povo, de todos os elementos da sua existência.
A leitura, a busca dessa leitura que nos é dada da história tem instrumentos, que são determinados pelas bases da investigação, e aqui quero mencionar o Homem, o meu velho conhecimento do Jorge.
Percorremos a licenciatura cruzando-nos ocasionalmente, numa Faculdade de Letras em efervescência, nos anos pós 25 de Abril em que a descoberta da cidadania se fazia na história, com notáveis “facilitadores” que muitas vezes eram, noutros momentos, camaradas, como António Borges Coelho, Cláudio Torres, Isabel Castro Henriques, Vítor Gonçalves, Manuel Maia, Mª José Trindade, Jorge Custódio meia dúzia que me vem à memoria de tantos que criaram uma dinâmica de aprendizagem que entroncava numa cidadania recuperada e num sentido para a história. Por estas Letras conheci o “Galinheiras” que era um tributo ao que penso era ou tinha sido o seu local de residência ou militância politica.
Em Letras penso que construímos um entendimento que motivou o re-encontro, com a magna História que o Jorge, continuador da busca, transformação do passado em conhecimento no presente, prosseguiu.
2-A Cidadania
# A medo vivo, a medo escrevo e falo,
hei medo do que falo só comigo;
mas inda a medo cuido, a medo calo#
Cavaleiro de Oliveira, citado em “O Judeu” de Bernardo Santareno
Não é possível identificar Portugal sem lhe reconhecermos a alma judaica,
mas também sem analisarmos a alma negra do medo da inquisição e do fanatismo, a alma megera da maldade, que tem que ver com o espírito da massa, manipulada sabiamente pela ignorância ao serviço da cupidez, e de interesses sócio-económicos específicos, de manutenção ou consolidação de privilégios.
A Inquisição, à qual como nos diz o Cavaleiro de Oliveira, agora pela palavra de Santareno “ se deve o empobrecimento do Reino, porque para substituir o Santo Ofício inventa judeus como outros fabricam moeda...! “
Mas o empobrecimento do Reino, ontem como hoje não é o empobrecimento de todos:
Uma economia fechada ao desenvolvimento comercial e industrial e à internacionalização e,
a mais cidadania que com essa mobilidade se gera,
uma classe dominante anquilosada em lógicas de poder familiar e de bens em meia dúzia, uma indústria incapaz de consolidação e sustentação no mercado,
um sistema politico bloqueado, dominado por castas e manipulado por instituições acima do crivo democrático, onde os cargos resultam de compra, e relações familiares,
não, não estou a falar dos dias de hoje, embora pudesse, mas das trevas que desde a Inquisição parecem toldar um Portugal que continua a arredar-se da sua história e a não aprender com a compreensão desta.
Defender a História toda, a sua melhor compreensão, é um acto da maior relevância politica e esta Breve História dos Judeus em Portugal é um marco incontornável para o direito dos jovens, de todos os portugueses ao seu passado.
Devia ser indispensável nos curricula escolares.
3- O Homem,
Já aqui referi algum passado que partilho com o Jorge.
Referi que nos reencontrámos no âmbito da publicação dos 3 volumes da magna História # Portugal e os Judeus#, e por esta me ter agradado e surpreendido, pela densidade, informação e envolvimento do historiador.
Penso, e isso já ficou claro, que o sujeito da história, aquele que nela pega, a constrói e re-constrói, nela procura os elementos que explicam outros elementos, a continuidade que busca outra continuidade, esse sujeito da história não pode ser um esbracejador de novelas rascas de figuras de pamplina, mas deve sim ser um cultor de responsabilidade cívica e social.
Cruzei-me, também, com o Jorge na realização, no quadro da concretização, num espaço carregado de história, no Largo de S.Domingos, do Memorial ao Massacre de 1506.
Esse Memorial regista, num espaço que é hoje na zona do novo “marranismo” que são os cruzamentos de populações de origens diversas, de diferentes religiões, dos mais vários costumes, que é a diversidade e o respeito por essa, perpetua o que queremos um elemento de referencia de direitos humanos e cidadania.
O Jorge é um historiador e um cultor da responsabilidade cívica, a quem agradeço mais este #Breve# que espero atinja outras almas e outras gentes...
Obrigado Jorge, pela tua compreensão.
sexta-feira, setembro 18, 2009
LANÇAMENTO COLECÇÃO "SEFARAD": DIA 24, 5ª FEIRA, 18.30H, LIVRARIA CÍRCULO DAS LETRAS
A colecção "Sefarad", que a editora Nova Vega agora lança a público, pretende divulgar os estudos judaicos e inquisitoriais portugueses, preenchendo assim um vazio editorial. Este projecto inovador estará atento aos estudos académicos, designadamente teses de mestrado e de doutoramento sobre judaísmo e Inquisição, que costumam ficar esquecidos nas universidades. Os destinatários privilegiados são os estudantes e os professores, particularmente os universitários, mas teremos o cuidado de tornar os nossos livros acessíveis à generalidade dos leitores interessados por estas importantes temáticas da História de Portugal.
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