IDADE E SEXO DOS REÚS SABUGALENSES (2)
De um total de 143 processos das Inquisições de Lisboa, Coimbra e Évora referentes a naturais ou/e residentes no actual território do concelho Sabugal entre os séculos XVI e XVIII, apenas 81 (57%) exibem a idade dos réus na descrição elaborada pela Torre do Tombo. É com aqueles em que estão identificadas as idades que vamos trabalhar estatisticamente. Dos 81 processos, 72 (88,9%) referem-se a réus acusados de judaísmo e 9 (11,1%) a outras acusações. É uma proporção compatível com a percentagem de processos de acusação de judaísmo (81,1%) no total dos 143 processos em estudo, como mostrámos na crónica anterior.
Quanto às idades dos réus, o mais novo tinha 14 anos quando foi preso nos cárceres da Inquisição e o mais velho tinha 80 anos (ambos estavam acusados de judaísmo). Eis a lista completa das idades: 14 anos: 1 processo; 15A: 2P; 17A: 1P; 18A: 3P; 19A: 4P; 20A: 1P; 21A: 1P; 22A: 1P; 23A: 2P; 24A: 2P; 25A: 2P; 28A: 5P; 30A: 7P; 31A: 3P; 32A: 1P; 33A: 6P; 34A: 1P; 35A: 3P; 37A: 1P; 38A: 2P; 40A: 5P; 41A: 1P; 42A: 1P; 43A: 1P; 44A: 1P; 45A: 1P; 46A: 1P; 47A: 2P; 50A: 3P; 55A: 1P; 56A: 3P; 60A: 6P; 64A: 1P; 65A: 1P; 68A: 1P; 70A: 1P; 75A: 1P; 80A: 1P.
Se hierarquizarmos as idades mais frequentes, obtemos a seguinte lista:
30 ANOS: 7 réus
33 ANOS: 6 réus
60 ANOS: 6 réus
28 ANOS: 5 réus
40 ANOS: 5 réus
19 ANOS: 4 réus
18 ANOS: 3 réus
31 ANOS: 3 réus
35 ANOS: 3 réus
50 ANOS: 3 réus
56 ANOS: 3 réus
Para se tornarem mais claras as faixas etárias com maior incidência, atentemos nos valores que seguem:
14-20 ANOS: 12 réus
21-30 ANOS: 20 réus
31-40 ANOS: 22 réus
41-50 ANOS: 11 réus
51-60 ANOS: 10 réus
61-70 ANOS: 4 réus
71-80 ANOS: 2 réus
Deste gráfico, ressaltam à vista as faixas etárias dos 31 aos 40 anos (22 processos) e dos 21 aos 30 anos (20 processos). Juntas, estas duas faixas etárias representam mais de metade (52%) dos processos com referência às idades dos réus. Assim, e em conclusão, os sabugalenses mais assolados pela Inquisição viviam na idade adulta (21-40 anos). Não deixa de ser significativo que a terceira faixa etária mais encarcerada estivesse abaixo dos 21 anos.
Quanto às idades dos réus, resta acrescentar os 9 processos de não acusados de judaísmo: 2 processos de 28 anos; 2 de 30 anos; 1 de 33 anos; 1 de 43 anos; 1 de 55 anos; 1 de 56 anos e 1 de 70 anos, ou seja, 4 da faixa dos 21-30 anos; 1 da faixa dos 31-40 anos; 1 da faixa dos 41-50 anos; 2 da faixa dos 51-60 e 1 da faixa dos 61-70 anos. Nada que contrarie a tendência geral das idades dos encarcerados pelas Inquisições.
Estes dados permitem-nos constatar que o judaísmo resistiu no concelho do Sabugal ao longo dos mais de dois séculos de investidas do Santo Ofício, pois os adultos e os jovens, que teriam mais a perder do que os idosos, não abandonaram a prática da sua religião ancestral, apesar das conhecidas sevícias a que eram submetidos nos cárceres da Inquisição. Não eram os velhos descuidados que caíam nas malhas do “fero monstro”, nome por que foi designada a Inquisição por um judeu português exilado, chamado Samuel Usque, que publicou, em Ferrara (Itália), uma notável obra em língua portuguesa, intitulada “Consolação às Tribulações de Israel”. Pelo contrário, eram os homens e as mulheres mais maduros e activos que persistiam em desafiar os inquisidores
E, por falar em mulheres, elas foram quase tantas como os homens a sofrer as agruras da sua coragem religiosa. Com efeito, os 143 processos estavam assim repartidos por sexo: 77 homens, ou seja 53,85% e 66 mulheres, ou seja 46,15%.
Para se poderem comparar os números de processos por sexo, referentes a cristãos-novos, cristãos-velhos e de situação social desconhecida, podemos acrescentar que temos, quanto aos homens, 52 são cristãos-novos homens (67,5%), 10 são cristãos-velhos (13%) e 15 de estatuto social desconhecido (19,5%); quanto às mulheres, 50 são cristãs-novas (75,7%), 5 cristãos-velhos (7,6%) e 11 desconhecidos (16,7%). Em suma: tanto os homens como as mulheres estão maioritariamente identificados como cristãos-novos.
Ver o artigo completo no Capeia Arraiana
segunda-feira, dezembro 14, 2009
terça-feira, dezembro 08, 2009
NA ROTA DOS JUDEUS DO SABUGAL (1)
PROCESSOS DA INQUISIÇÃO REFERENTES AO SABUGAL
A presença de uma comunidade judaica no Sabugal está documentada (pelo menos) desde o início do século XIV. Os reconhecidos estudos medievais da historiadora Maria José Ferro Tavares incluem a comuna judaica do Sabugal entre as três dezenas que identificou para o período de 1279-1383, tendo confirmado documentalmente a sua existência em 1316, através de uma dívida dos judeus do Sabugal ao rei D. Dinis em 16 de Agosto desse ano.
Mas a comunidade judaica do Sabugal manteve-se até ao final do século XV. Com efeito, a menos de um ano da expulsão dos judeus, que D. Manuel I decretou em Dezembro de 1496, também há prova documental da persistência da judiaria do Sabugal, como o atesta uma carta de D. Manuel datada de 12 de Janeiro de 1496. O resto da infeliz história dos judeus portugueses dessa época é conhecido: depois do decreto de expulsão de 1496, seguiu-se o baptismo forçado de 1497, com a consequente proibição do judaísmo e a destruição das comunidades judaicas de todo o reino, sobretudo a partir da introdução da Inquisição, que existiu legalmente entre 1536 e 1821.
Mas, se desapareceram as comunidades judaicas, não aconteceu o mesmo ao judaísmo que, de forma secreta ou disfarçada, sobreviveu a quase três séculos de acção criminosa dos tribunais da Inquisição de Lisboa, Évora e Coimbra (e Goa, na Índia). De entre os cerca de 45.000 processos das Inquisições, existentes na Torre do Tombo, alguns narram a resistência dos judeus do Sabugal. Por isso, fomos à procura deles e encontrámos 143 processos relativos a pessoas que viviam ou/e haviam nascido no actual território do concelho do Sabugal quando foram parar aos cárceres do Santo Ofício.
A partir de hoje, daremos aqui, no Capeia Arraiana, conta dos resultados preliminares da análise desses processos. A primeira conclusão que podemos tirar é que, dos 143 processos, 102 foram identificados como cristãos-novos (descendentes de judeus), representando 71,3%, enquanto apenas 15 se referem a cristãos-velhos (descendentes de cristãos) e representam 10,4%. Se tivermos em conta que 26 processos (18,3%) não identificam o estatuto social dos réus, restam-nos 127 processos com estatuto social conhecido, aumentando para 80% a percentagem de cristãos-novos contra 20% de cristãos-velhos. Em consequência, podemos concluir que os judeus eram a vítima predilecta dos inquisidores.
Continuando a analisar os processos do Sabugal, temos 116 (81,1%) acusados de judaísmo, 5 (3,4%) acusados de blasfémia, 5 acusados de heresia (3,4%), 4 acusados de bigamia (2,7%), 2 acusados de visões (1,3%) e 11 (8,1%) julgados por várias acusações, com 1 processo cada um: sacrilégio, luteranismo, sodomia, perjúrio, pacto com o demónio, impedimento do ministério do Santo Ofício, violação de Ordens religiosas, abuso da função de padre, feitiçaria, intitular-se abusivamente oficial da Inquisição e molinismo (seita religiosa).
Finalmente, dos 102 processos a cristãos-novos, 97 (95%) foram acusados da prática da religião judaica. Os restantes 5 (5%) foram acusados de blasfémia, bigamia, heresia, de impedir o ministério do Santo Ofício e violação de Ordens religiosas. Também se pode concluir que a acusação de judaísmo era esmagadoramente maioritária. Em suma: a Inquisição foi, efectivamente, introduzida em Portugal para perseguir os judeus e o judaísmo e o caso do Sabugal confirma plenamente essa tese.
Ver o artigo completo no Capeia Arraiana
A presença de uma comunidade judaica no Sabugal está documentada (pelo menos) desde o início do século XIV. Os reconhecidos estudos medievais da historiadora Maria José Ferro Tavares incluem a comuna judaica do Sabugal entre as três dezenas que identificou para o período de 1279-1383, tendo confirmado documentalmente a sua existência em 1316, através de uma dívida dos judeus do Sabugal ao rei D. Dinis em 16 de Agosto desse ano.
Mas a comunidade judaica do Sabugal manteve-se até ao final do século XV. Com efeito, a menos de um ano da expulsão dos judeus, que D. Manuel I decretou em Dezembro de 1496, também há prova documental da persistência da judiaria do Sabugal, como o atesta uma carta de D. Manuel datada de 12 de Janeiro de 1496. O resto da infeliz história dos judeus portugueses dessa época é conhecido: depois do decreto de expulsão de 1496, seguiu-se o baptismo forçado de 1497, com a consequente proibição do judaísmo e a destruição das comunidades judaicas de todo o reino, sobretudo a partir da introdução da Inquisição, que existiu legalmente entre 1536 e 1821.
Mas, se desapareceram as comunidades judaicas, não aconteceu o mesmo ao judaísmo que, de forma secreta ou disfarçada, sobreviveu a quase três séculos de acção criminosa dos tribunais da Inquisição de Lisboa, Évora e Coimbra (e Goa, na Índia). De entre os cerca de 45.000 processos das Inquisições, existentes na Torre do Tombo, alguns narram a resistência dos judeus do Sabugal. Por isso, fomos à procura deles e encontrámos 143 processos relativos a pessoas que viviam ou/e haviam nascido no actual território do concelho do Sabugal quando foram parar aos cárceres do Santo Ofício.
A partir de hoje, daremos aqui, no Capeia Arraiana, conta dos resultados preliminares da análise desses processos. A primeira conclusão que podemos tirar é que, dos 143 processos, 102 foram identificados como cristãos-novos (descendentes de judeus), representando 71,3%, enquanto apenas 15 se referem a cristãos-velhos (descendentes de cristãos) e representam 10,4%. Se tivermos em conta que 26 processos (18,3%) não identificam o estatuto social dos réus, restam-nos 127 processos com estatuto social conhecido, aumentando para 80% a percentagem de cristãos-novos contra 20% de cristãos-velhos. Em consequência, podemos concluir que os judeus eram a vítima predilecta dos inquisidores.
Continuando a analisar os processos do Sabugal, temos 116 (81,1%) acusados de judaísmo, 5 (3,4%) acusados de blasfémia, 5 acusados de heresia (3,4%), 4 acusados de bigamia (2,7%), 2 acusados de visões (1,3%) e 11 (8,1%) julgados por várias acusações, com 1 processo cada um: sacrilégio, luteranismo, sodomia, perjúrio, pacto com o demónio, impedimento do ministério do Santo Ofício, violação de Ordens religiosas, abuso da função de padre, feitiçaria, intitular-se abusivamente oficial da Inquisição e molinismo (seita religiosa).
Finalmente, dos 102 processos a cristãos-novos, 97 (95%) foram acusados da prática da religião judaica. Os restantes 5 (5%) foram acusados de blasfémia, bigamia, heresia, de impedir o ministério do Santo Ofício e violação de Ordens religiosas. Também se pode concluir que a acusação de judaísmo era esmagadoramente maioritária. Em suma: a Inquisição foi, efectivamente, introduzida em Portugal para perseguir os judeus e o judaísmo e o caso do Sabugal confirma plenamente essa tese.
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